Dharun Ravi
homofobia
Ian Parker
Molly Wei
reportagem
revista
the new yorker
tradução
Universidade Rutgers
A história de um suicídio (parte V)
Dois universitários, uma webcam, e uma tragédia.
Reportagem de Ian Parker
Nas duas primeiras audiências ocorridas no ano passado, as fileiras
de bancos, atrás de Dharun Ravi, estavam apenas com a metade de sua
lotação. Mas numa terceira audiência, em dezembro, o mesmo espaço
estava lotado. Duas dúzias de homens de terno, a maioria deles do
Sul da Ásia, chegavam e saíam em grupos; eram amigos da família,
que depois de algum debate privado, decidiram mostrar apoio.
Foto: divulgação
Um membro desse grupo, Anil Kappa, um amigo do pai de Ravi, concordou
em encontrar-me num café em Princeton. Quando se sentou, disse que
seu coração estava arrasado pelo que aconteceu à família
Clementi. Comentou também, em voz baixa, consternado, sobre a prisão
e difamação de Ravi: “Tenho lido que ele é um idiota, que
pratica bullyng, que é homofóbico, mas eu o conheço, o vi crescer
– o que sei dele não tem qualquer relação com qualquer uma
dessas acusações”.
Em sua visão, as ações de Ravi, foram “brincadeiras infantis que
deram errado”, em uma cultura fortemente influenciada pelas
celebridades e pelo uso do twitter de forma indiscriminada como em
”American Pie” (uma comédia em que um jovem configura
secretamente uma transmissão via webcam). “O sistema judicial
tinha levado as coisas longe demais”, disse ele. A família de Ravi
vinha lutando para viver uma vida normal desde a prisão, e Ravi, que
voltou a morar com os pais, se tornou incapaz de sair de casa. "Ele
foi preso, e foi vilipendiado", disse Kappa. “No momento não
conseguimos nos focar em outra coisa”.
Assim como o pai de Dharun, Kappa é engenheiro de software. Eles se
conheceram na década de noventa, quando os dois ainda viviam no sul
do estado indiano de Tamil Nadu, onde nasceram. Ravi Pazhani e sua
esposa, Sabitha, uma dona de casa com formação em artes liberais,
tinha, na época, seus vinte anos, e seu filho Dharun era uma
criança. (Após a convenção de Tamil, Dharun teve o primeiro nome
de seu pai, transformado em seu sobrenome). Em 1995 Kappa mudou-se
para a América, dois anos depois, ele convenceu Pazhani a fazer o
mesmo. Primeiro a família se estabeleceu em Woodbridge, a leste de
New Brunswick, e Pazhani foi transferido para Nova York como
consultor de software. Ainda hoje, Pazhani continua nesse trabalho, e
possui, juntamente com Kappa, uma empresa de tecnologia da
informação, em Nova Jersey. Kappa descreve Pazhani como
conservador, mas não conseguiu entender a idéia de Dharun de que
seu pai iria querer arremessar seu companheiro de quarto pela janela
só pelo fato dele ser gay. (Ravi e seus pais se recusaram a dar
entrevistas para este artigo).
O irmão de Dharun, que atende pelo nome de Jay, nasceu em 2002. Ele
é o único da família com cidadania americana. Se Dharun for
condenado ele pode ser deportado e isso influenciou seu pensamento
sobre fazer um acordo. Alguns anos após o nascimento de Jay, a
família mudou-se para Plainsboro, que tem uma percentagem incomum de
índios-americanos. Nas reuniões que os amigos da família faziam ao
redor da piscina, Ravi era, muitas vezes, o filho mais velho dos que
ali estavam presente, e Kappa lembra-se que ele era gentil com os
mais jovens, “vivia brincando, ensinando truques para a molecada…
nunca foi hostil”. Ele acrescentou que Ravi o ensinara a patinar.
Mas, na adolescência, Ravi aparentava ter dificuldades no convívio
social. Quando ele tinha treze anos, blogou sobre um incidente no
qual “nós demos a ele uma bola de futebol no corredor e começamos
a gritar para ele ir para o gol e marcar. Gritamos com ele por 5
minutos até que ele soltou a bola, deixou cair. E nós gritamos,
chuta”. Uma moça, Lucy Chen, escreveu recentemente, na internet,
sobre o período que passou com Ravi num acampamento na Pensilvânia
realizado pelo Centro de Jovens Talentos, em 2008. “Ele não se
abria com qualquer um, mas foi muito legal comigo”, escreveu ela.
“Dharun e eu acabamos nos tornando os melhores amigos no
acampamento. Inseparáveis!” Ela continua: “No último dia, tudo
que fizemos foi nos abraçarmos. Bem, na verdade, eu o abracei e ele
não abraçava de volta”. A mensagem foi escrita em apoio a Ravi,
mas Chen acrescentou: “Eu acho que ele hackeou o meu computador,
embora eu não tenha provas”.
Tam Jason conhece Ravi desde a sétima série. Hoje, estudando em
Nova York, Tam é uma das poucas pessoas do colegial que manteve
contato com Ravi desde que ele foi preso. Embora Tam descreva sua
relação como de forte amizade, em uma entrevista recente, realizada
via mensagens instantâneas, o seu tom era ríspido. “Ravi”,
disse ele, era “arrogante, mentiroso, e obcecado por ser visto como
rico”. Apesar de Ravi ser “engraçado às vezes,” e até uma
boa companhia de vez em quando, Tam disse que “ele é um saco”,
acrescentando: “eu confio mais numa pedra do que em Dharun”. O
menosprezo que Tam demonstra por Ravi, enquanto este último aguarda
julgamento, levantou rumores de uma possível briga entre os dois.
Tam negou; assim como Ravi, ele parece não entender o valor da
auto-censura. (“Seria legal fazer com Dharun como se faz com o
lixo, vamos parar de falar sobre ele”, disse.) Mas a falta de
cautela de Tam dá uma espécie de autoridade para a sua negação
sobre a homofobia de Ravi. Como Tam disse, “Ele é tão idiota que
pode parecer homofóbico, mas não é.”
Molly Wei conhecia Ravi, muito antes de entrarem para a Rutgers. Ela
se recusou a dar entrevista, mas em abril passado, em uma declaração
à polícia, explicou que, durante o ensino médio, ela e Ravi não
eram “realmente” namorados, mas eram “muito próximos”. Ela
disse: “Eu confiava nele em relação a muitas coisas”. No final
do ensino médio, no entanto, ela reparou que Ravi se tornou uma
pessoa não confiável. Ela disse que ele alegou ter sido o capitão
de um time de basquete composto só por negros e que havia vencido o
campeonato estadual. E ele lhe disse que estava estampado “em
outdoors por toda a Índia, e que era famoso no Canadá por causa do
snowboard". Ela supunha que ele estava tentando impressioná-la e
tentou “explicar-lhe que seria melhor se ele parasse”. Mas ele
foi realmente inflexível sobre isso. “Ele era do tipo, ‘Não,
este é quem eu sou’”. Wei cortou relações com ele. Durante seu
último ano, Wei ia contando tudo isso para Mark Lin, um amigo em
comum. Lin passou por situações semelhantes às contadas pela amiga
e relatou à polícia, Ravi “ficou muito louco, porque ninguém o
confronta sobre essas coisas”. Ela disse que Ravi a chamou de
“cadela mentirosa” e “prostituta”.
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